O crime organizado, a política e as redes sociais, por Luís Nassif

Ou se monta uma grande frente contra o crime organizado ou, em breve, este país se converterá em uma grande Colômbia

O caso Pablo Marçal precisa ser encarado de frente pelas autoridades. Não propriamente pelas autoridades eleitorais, mas judiciárias e policiais. Marçal vem do submundo extra-legal. Especializou-se em toda sorte de golpes, tendo como instrumento-mãe o controle das redes sociais.

Recentemente, The Intercept enviou o repórter Paulo Motoryn à África e ao Nordeste. Na África para levantar o que foi feito com quase R$6 milhões captados junto ao público para a construção de casas em uma aldeia africana. Não foram entregues nem 10%. Depois, foi para uma cidadezinha do Nordeste, onde supostamente estariam localizadas duas ONGs que receberam as doações. Eram ONGs fantasmas.

Este foi apenas um dos golpes aplicados por Marçal e identificados pelo jornalismo – não pelo sistema judicial. Toda sua fortuna e carreira foram moldados nesse submundo, onde não entra a fiscalização oficial.

O empreendedorismo de Marçal abarca todas as formas de arrancar dinheiro de incautos, todos os modelos de estelionato.  Manobra a crença dos seus seguidores, vende livros de autoajuda, simula milagres divinos, levanta dinheiro para as causas mais nebulosas, tem negócios de toda espécie, até em Angola, além de parcerias virtuais com influenciadores acusados de ligações com o tráfico.

Há estelionatos de toda espécie, que culminaram com o falso diagnóstico de consumo de cocaína por um adversário político. O parceiro é um médico envolvido em outros estelionatos. E a tentativa de assassinato reputacional de um adversário, revela o modus operandi das grandes organizações criminosas.

Em um mundo onde o PCC e outros grandes grupos movimentam bilhões com tráfico e outras formas de ilegalidades, quem sabe até onde vão as parcerias dos empreendedores digitais, se nem Receita, nem Polícia Federal têm a menor ideia sobre seu fluxo de faturamento?

Em suma, as redes sociais permitiram a proliferação de golpes por todos os poros. Permitiram a expansão das organizações criminosas bancando candidaturas municipais, explorando o universo das organizações sociais. E, agora, surge um organizador geral ambicionando o poder político, trazendo atrás de si a parceria com estelionatários de todos os tipos, os religiosos, os vendedores de auto-ajuda, os vendedores de solidariedade.

As redes lhes deram poder de dar golpes, ameaçar pessoas, criar seguidores cegos, unidos por crenças e por relações de subordinação emocional, tudo, enfim, o que caracteriza o modus operandi das grandes organizações criminosas. E essa atividade foi naturalizada pela mídia, cobrindo o “fenômeno”, como se fosse um empreendedor em atividades legais.

A ascensão do fenômeno Marçal acende todas as luzes amarelas da democracia. E exigem medidas rápidas e profundas:

  1. Levantamento de todas as formas de negócios desenvolvidas por ele, para identificar suas ramificações e ilegalidades.
  2. Acelerar a legislação de controle das redes sociais.
  3. Convocar a Polícia Federal, policias civis estaduais, Ministérios Públicos Estaduais para uma ação concatenada contra o crime organizado, especialmente contra o que explora organizações sociais. 

Conheço melhor apenas duas cidades do interior: Poços de Caldas e São João da Boa Vista. Em ambas as cidades, há golpes frequentes das prefeituras locais com organizações sociais golpistas. E, em ambos os lugares, sob beneplácito dos promotores estaduais. Agora, com o auxilio generoso das bets, abre-se mais uma frente de consolidação desse país paralelo.

Ou se monta uma grande frente contra o crime organizado ou, em breve, este país se converterá em uma grande Colômbia.

9 Comentários

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  1. Bom dia Nassif. Não apenas OS´s, o PCC está dominando as licitações de obras públicas nas pequenas cidades. Um amigo de faculdade que tem uma empresa foi impedido (junto com outros concorrentes) de participar de uma licitação para reforma de um posto de saúde em uma cidade pequena da Grande SP. O prédio da prefeitura foi cercado pelos comparsas do PCC, que impediam todos de entrar. Apenas o “parça” do PCC disputou a licitação e ganhou com preço cheio. Parece que está tudo dominado já

    1. Luis nos traz ocorrência escandalosa da inação do aparelho repressor do Estado na confrontação dos grupos criminosos cada vez mais organizados, financiados e, daí, poderosos.
      Tendo como plataformas as redes sociais deveria caber ao governo federal a iniciativa de estruturação da legislação e grupos investigativos e de ação via deputados/senadores, PF, Ministério Público Federal e STF.
      Também maior integração das polícias estaduais com a federal.
      Sonho primaveril ?

  2. O Big Bang da destruição política,institucional, social e econômica do Brasil foi detonado com as manifestações de 2013 e atingiu o ápice com o impeachment de Dilma. Assim como o Irã pós revolução islâmica, sofreremos durante décadas os efeitos daquelas sandices.

  3. Meu nobre jornalista Nassif, bom dia! Na realidade essa tal de Marçal é apenas uma pontinha do iceberg. Aqui sempre foi um porto seguro para os adeptos da bandidolatria e do democidio. Como um exemplo cito o criminoso Lindolfo Aleixo de barros que assassinou inúmeras pessoas, cometeu latrocídio e outros crimes. Era capanga de uma família latifundiária e protegido. Nunca foi preso (https://vincit3.com.br/index.php/2024/09/27/o-crime-compensa-no-brasil/) e o outro criminoso, o famoso estrangeiro Ronald Bigs que aqui aportou e por aqui ficou por mais de 30 anos, na mais completa impunidade. Teve até uma forcinha do STF da época. Um show de proteção aos criminosos, o que ainda ocorre nos dias atuais. Na realidade tudo como dantes no quartel de Abrantes. E assim am democracia já está manipulada, condicionada e amputada por criminosos de todas as cores e matizes. É a nova ordem brasilienseis atrelada a NOM!

  4. Não é por nada, não, mas eu creio que o crime organizado está infiltrado na máquina pública (e não apenas da América Latina) desde o início dos tempos. É engraçado, mas nesse último fim de semana, conversando sobre futebol, eu disse que muitos jogadores de futebol, nos tempos pré-internet e redes sociais, viviam em noitadas, com mulheres, bebida, e drogas; e, no mais das vezes, o público só ficava sabendo disso depois que o jogador pendurava as chuteiras; hoje, os que fazem as mesmas coisas tem de fazê-lo às escondidas, pois em qualquer lugar que foram tem um batalhão de celulares prontos a filmar e fotografar a cena. Creio que se dá a mesma coisa hoje, com o crime organizado na política e em outros meios sociais. Em muitos casos, eles mesmos se expõem, sem o menor medo de produzirem provas contra si mesmos. O crime organizado sempre esteve em toda parte, na sociedade, na política, no futebol, enfim, em todos os lugares onde é possível estar, e lucrar. Há anos eu pergunto àqueles que acreditam que Lula é ladrão, se eles conhecem algum ladrão que não usufrua do que roubou. Nunca ninguém viu, nem vai ver, Lula ostentando, por um motivo muito simples: ele não é ladrão. Mas, ninguém responde essa pergunta, embora continuem todos acreditando, piamente, que Lula roubou bilhões. Mas, infelizmente, a pergunta está perdendo seu poder de questionamento, pois hoje até os ladrões se orgulham e divulgam do que vivem.

  5. Como seo Nassif? Com esse congresso? Boa parte fo povo, do MP, das polícias, do judiciário, são a cara desse tal Marçal…a extrema direita fascista não brotou da terra, foi eleita e tem apoio desses aí citados…mais que o tal Marçal aprontou e ninguém o incomodou……tal qual Bolsonaro, Marçal sapateou na cabeça do judiciário….imaginem se fosse Lula a receber milhões em “presentes” de príncipes árabe..tava preso novamente…o futuro é tenebroso… oremos… sim é ironia..

  6. Nassif, se quiser entrar em contato, tenho um caso interessante para relatar sobre OS em uma cidade rica de médio porte – 500 mil habitantes. Seria interessante a exposição do tema, que na mídia local pouco repercutiu.

    PS: eu entendo que está sendo apontada causa, não consequência. Consequência desse estado de coisas foi, na prática, a inviabilização da investigação e condenação criminal pelo Judiciário, por exigir provas e metodologias impossíveis pra condenação; o total esvaziamento da lei de improbidade istrativa; e a inocuidade das regras de decoro parlamentar, espalhando um verdadeiro vale tudo na política, porque resvala tb nas práticas partidárias e eleitorais. Reformular regras processuais penais (e até alguns tipos penais), penalizações istrativas e aplicação mais rigorosa das regras de decoro resolveria 50% (ou mais) dos problemas com políticos e candidatos aventureiros – e, especialmente, os criminosos.

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